16 abril, 2020

A atualidade nos fez parar, de algumas formas, mas ao mesmo tempo fez com que muitas famílias entrassem em uma aceleração interminável, principalmente as mães, não temos como ignorar o fato de que ainda hoje, são as mulheres na sua grande maioria que são responsáveis por alimentar, cuidar, limpar, e vivenciar a rotina da criança e do lar. Está surgindo a necessidade de reorganizar não só suas próprias dinâmicas externas, de trabalho e compreensão desta nova forma de relacionar-se com o mundo, mas também suas demandas internas que estão sempre em movimento e transformação. E, para além de toda esta realidade difícil e nova, ainda faz-se  necessário o desdobramento dos papéis na maternidade, ocupando também o papel de professora. 
A uns dias atrás, uma amiga me manda uma mensagem  "e aí, como está, tem dado aulas para sua filha?". Respondi prontamente que sim, estava à ensinando a viver. Hoje algumas reflexões se fizeram presente em mim, percebi como ficou normal, ou até mesmo obrigação, virarmos professoras e, estarmos mais preocupadas com o desempenho ou o tempo que "está sendo perdido" do que com tantas necessidades que precisam ser organizadas também no imaginário da criança -e do próprio adulto-. As famílias podem acabar criando tão fortemente em si a necessidade de cumprir as atividades curriculares das crianças, as horas de aulas virtuais, que podem acabar perdendo o essencial, que é o afeto tão necessário no momento atual. Relacionar-se através deste controle e disciplina do desemprenho, afasta o que de mais precioso existe em dois humanos, que é a relação mais íntima e verdadeira, a possibilidade de olhar a criança e tentar alcançar o que pode estar surgindo de medos, dúvidas e preocupações com todas estas grandiosas mudanças. E a partir disto surge o cansaço, que vem como resultado de uma vida posta a trabalhar, uma vida que nos faz distanciar dos desejos que há em nós, como se só fizesse sentido o viver, quando podemos estar voltados a trabalhar e produzir. Quem somos quando nos tira a possibilidade de estarmos em escritórios tantas horas por dia? Como estamos produzindo nossas subjetividades, nossos olhares únicos e pessoais? Agora nossas opressões estão vindo de dentro. Engolimos as demandas e nos alimentamos do que é posto, sem compreender qual a fome que temos. O corpo se tornou esta vasilha onde nunca de chega à última gota.

"Quem se entendia no andar e não tolera estar entediado, ficará andando a esmo inquieto, irá se debater ou se afundará nesta ou naquela atividade. Mas quem é tolerante com o tédio, depois de um tempo irá reconhecer que possivelmente é o próprio andar que o entendia. Assim, ele será impulsionado a procurar um movimento totalmente novo. […] Comparada com o andar linear, reto, a dança, com seus movimentos revoluteantes, é um luxo que foge totalmente do princípio do desempenho”. (Byung-Chul Han, Sociedade do Cansaço, p.35).
Nos distanciamos do ser presença. Esquecemos do tempo que temos para o espanto das belezas do dia, do pequenos detalhes. Qual parte de nós está vivendo os nossos dias? 



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