08 junho, 2020

vagalumes

cada cor que surge no meu caminho, encantando-me, quero parar os seus passos para que se encante com toda beleza que há no viver. na descoberta de frutos no galho de uma árvore, na formas que tem as folhas, no desconhecido canto dos belos e pequenos pássaros. descobrimos que existem borboletas que quando batem suas asas fazem sons que nossos ouvidos podem captar e impressionar-se.
depois das noites úmidas e chuvosas, as manhãs são lentas e a quantidade de folhas que foram banhadas é imensa, elas ganham gotas de enfeite, tão perfeitamente penduradas quebra-te parece que já são delas. observar a força e delicadeza do que se é ser gota é aprofundar na vida. quantas vezes fomos gotas?
quando o anoitecer se faz presente aos nossos olhos, vagalumes chegam e preenchem uma imensidão de espaços, são como estrelas na terra, que dançam no ritmo perfeito para o som da harpa que colocou para ouvirmos.
são instantes que o silêncio se faz presente e deixamos que nossos corpos estejam inteiros. a matéria se transforma, brota a certeza que ainda há beleza, a raiz ainda cresce embaixo da terra, preenchemos espaços. se das em pares, em concreto. ainda dá. ainda somos e insistindo em viver.

16 abril, 2020

A atualidade nos fez parar, de algumas formas, mas ao mesmo tempo fez com que muitas famílias entrassem em uma aceleração interminável, principalmente as mães, não temos como ignorar o fato de que ainda hoje, são as mulheres na sua grande maioria que são responsáveis por alimentar, cuidar, limpar, e vivenciar a rotina da criança e do lar. Está surgindo a necessidade de reorganizar não só suas próprias dinâmicas externas, de trabalho e compreensão desta nova forma de relacionar-se com o mundo, mas também suas demandas internas que estão sempre em movimento e transformação. E, para além de toda esta realidade difícil e nova, ainda faz-se  necessário o desdobramento dos papéis na maternidade, ocupando também o papel de professora. 
A uns dias atrás, uma amiga me manda uma mensagem  "e aí, como está, tem dado aulas para sua filha?". Respondi prontamente que sim, estava à ensinando a viver. Hoje algumas reflexões se fizeram presente em mim, percebi como ficou normal, ou até mesmo obrigação, virarmos professoras e, estarmos mais preocupadas com o desempenho ou o tempo que "está sendo perdido" do que com tantas necessidades que precisam ser organizadas também no imaginário da criança -e do próprio adulto-. As famílias podem acabar criando tão fortemente em si a necessidade de cumprir as atividades curriculares das crianças, as horas de aulas virtuais, que podem acabar perdendo o essencial, que é o afeto tão necessário no momento atual. Relacionar-se através deste controle e disciplina do desemprenho, afasta o que de mais precioso existe em dois humanos, que é a relação mais íntima e verdadeira, a possibilidade de olhar a criança e tentar alcançar o que pode estar surgindo de medos, dúvidas e preocupações com todas estas grandiosas mudanças. E a partir disto surge o cansaço, que vem como resultado de uma vida posta a trabalhar, uma vida que nos faz distanciar dos desejos que há em nós, como se só fizesse sentido o viver, quando podemos estar voltados a trabalhar e produzir. Quem somos quando nos tira a possibilidade de estarmos em escritórios tantas horas por dia? Como estamos produzindo nossas subjetividades, nossos olhares únicos e pessoais? Agora nossas opressões estão vindo de dentro. Engolimos as demandas e nos alimentamos do que é posto, sem compreender qual a fome que temos. O corpo se tornou esta vasilha onde nunca de chega à última gota.

"Quem se entendia no andar e não tolera estar entediado, ficará andando a esmo inquieto, irá se debater ou se afundará nesta ou naquela atividade. Mas quem é tolerante com o tédio, depois de um tempo irá reconhecer que possivelmente é o próprio andar que o entendia. Assim, ele será impulsionado a procurar um movimento totalmente novo. […] Comparada com o andar linear, reto, a dança, com seus movimentos revoluteantes, é um luxo que foge totalmente do princípio do desempenho”. (Byung-Chul Han, Sociedade do Cansaço, p.35).
Nos distanciamos do ser presença. Esquecemos do tempo que temos para o espanto das belezas do dia, do pequenos detalhes. Qual parte de nós está vivendo os nossos dias?